Ocorreu-me nesses dias uma lembrança muito engraçada e um tanto quanto curiosa da minha infância. Lembrança essa que viera à tona enquanto eu e meus colegas observávamos maravilhados e ao mesmo tempo assustados, a chuva que caía torrencialmente e que poucas vezes fora vista por nossos olhos de vinte e poucos anos. Lembrei-me desse fato, porque na hora da chuva, o vento era muito forte, a famosa “chuva de vento” que sempre dá aquele medinho lá no fundo de cada um de nós.
Quando eu era pequena... E quando eu digo pequena é pequena mesmo, pois tinha que subir naquelas madeiras que sustentam as tábuas da porta e suas dobradiças, pra poder, na ponta dos pés, ver a chuva caindo (coisa que aprecio desde que consigo me lembrar). Era uma tarde de domingo, a gente costumava ir à casa dos meus avós, quase que todo final de semana, na época de chuvas especialmente e esse final de semana não foi diferente.
A chuva começou de repente com aqueles enormes pingos que chegam a doer o juízo se atingem nossa cabeça; corremos pra dentro da casa, porque minha mãe e minha vó logo começaram a gritar, mandando sairmos da chuva, por que se dependesse de mim ficava!
Eu entrei e como sempre, fui logo me trepar nas madeiras da porta, pra ficar observando aquilo tudo, mas naquele dia foi diferente, começou de súbito uma ventania que mais parecia que iria carregar consigo, casa, mãe, vó, vô, inclusive eu, que mesmo com medo, agarrava-me forte à porta, mas não saía de lá! Queria ver tudo!
Todos estavam com medo da chuva, o vento era muito forte e aquilo começou a ficar mesmo sério, quando minha vó percebeu que suas amadas plantas e flores estavam sendo devastadas por aquele vento incontrolável... Aí não!! Um absurdo desses não poderia acontecer!! Tudo, menos maltratar suas lindas e queridas plantas!!
Minha vó tinha plantas e flores por todo o entorno da casa; casa de quintal enorme e terreiro maior ainda e ainda do lado da casa um terreno cercado com mais uma enorme variedade de plantas e flores, o qual ela chamava carinhosamente de “minha horta”. Quando viu todas as suas lindas flores machucadas ou caindo com a força do vento ela decidiu tomar decisões drásticas...
Foi até a pequena cozinha que havia ao fundo da cozinha maior, onde o fogão de lenha cozinhava vagarosamente o feijão na panela de barro, pegou uma considerável quantidade de cinzas, o suficiente pra encher uma bacia pequena, daquelas brancas de estanho que todo mundo tem ou já teve em casa (pelo menos todo sertanejo); pegou também duas facas peixeiras enormes com as quais meu avô costumava cortar a lenha mais fina pra acender o fogo e veio em direção à porta da cozinha, onde eu estava “pendurada”.
Aquela cena me tirou a concentração da chuva e elevou meu olhar curioso àqueles elementos nas mãos da minha vó.
Foi então que eu perguntei:
- Vovó, pra quê isso??!?
Ela respondeu-me com sabedoria:
-Então não sabe menina?!!?
-As facas são pra cortar o vento e as cinzas pra fazer a chuva parar!!!!
Fiquei intrigada. Como poderia?? Duas facas e uma bacia de cinzas, conseguirem parar a própria natureza?!?!
Minha vó jogou por cima da minha cabeça, primeiro, uma das facas na diagonal e em seguida a outra no sentido oposto, como se formassem um “X” e disse:
-Tem que jogar cruzado senão não funciona!
Em seguida jogou as cinzas bem pro alto e com força de tal forma, que se espalharam, mesmo com toda aquela chuva e pronto! Estava feito!!Não sei como, se pela “simpatia” da minha sábia avó ou mesmo obra coincidente da natureza...
Só sei que não deram 2 minutos e a chuva converteu-se em garoa daquelas que dá vontade de dormir pra sempre...
Adriane Freire
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